O mundo parou para enfrentar os efeitos letais do novo coronavírus. O isolamento e
o distanciamento social, necessários para bloquear a propagação do vírus e o agravamento
da crise sanitária, travou a atividade produtiva com os mais severos impactos para o mundo
do trabalho ao longo de 2020. Os gravíssimos problemas exigiram medidas de emergência
e políticas públicas nas áreas da saúde e da proteção de renda e empregos.
O mundo do trabalho sofreu impactos jamais vistos nessa extensão, quantidade e
intensidade. No Brasil, em poucas semanas, mais de 20 milhões de pessoas foram para a
inatividade decorrente da necessidade de isolamento social. Outros 8,5 milhões foram para
o trabalho em home office, cerca de 5 milhões continuaram no desalento e mais de 13
milhões ficaram em desemprego aberto. Por outro lado, milhões continuaram trabalhando
com altíssimo risco tanto no serviço de saúde como nas atividades essenciais. Muitos
morreram trabalhando para nos salvar!
No Brasil a dinâmica de enfretamento foi, e continua sendo, contraditória. De um
lado, o (des)governo Bolsonaro fez de tudo para descoordenar o enfretamento que
realizaram os governos subnacionais. Além disso, minimizou a crise sanitária, desestimulou
o uso de máscaras e de distanciamento social e agora, como se não bastasse, difunde
campanha contra a vacinação, ignomínias de uma longa lista de atitudes que coloca o país
na vergonhosa segunda posição em termos de número de morto, grande parte evitáveis.
De outro lado, é quase inimaginável que se tenha conseguido mobilizar a proteção
social proposta pelas Centrais Sindicais, movimento sociais, parlamentares, governadores e
prefeitos, recepcionadas pelo Congresso Nacional sensível ao problema, aprovando um
orçamento especial que proporcionou criar um Abono Emergencial de R$ 600,00 e que
protegeu mais de 65 milhões de pessoas; um auxílio salarial que protegeu quase 10 milhões
de trabalhadores, além recursos para que as micro, pequenas, médias e grande empresas
resistissem. Um custo que deve superar o equivalente a 8% do PIB. Contraditório porque,
lembremos, essas medidas contaram com o posicionamento contrário do governo federal,
que só as implementou por decisão do Congresso ou do Poder Judiciário.
A queda econômica estimada de 4% a 5% só não será maior devido aos efeitos
positivos sobre a demanda propiciados pelas medidas de proteção da renda. O terceiro
trimestre revelou uma boa retomada da atividade economia, com exceção do setor de
serviços que continua abaixo da posição de fevereiro. O problema é que os dados do quarto
trimestre indicam a desaceleração da intensidade do crescimento. Parece que o país voltará
aos medíocres índices anuais de 1% de crescimento do PIB.
No quadro atual do mundo do trabalho, o fim dos auxílios emergencial e salarial
pressionará milhões de trabalhadores protegidos a procurar de um posto de trabalho. A
busca infrutífera por um posto de trabalho predomina e as taxas de desemprego crescem
nos últimos meses e continuarão a crescer no primeiro semestre de 2021. De outro lado,
muitos daqueles que retornarão do home office ou da suspensão do contrato de trabalho
encontrarão a empresa fechada, falida ou reduzindo a atividade. Muitos serão demitidos, o
que também pressionará o desemprego, porque a geração de postos de trabalho seguirá
inferior a uma demanda jamais vista.
A saída dessa crise sanitária exigirá ações muito além de vacinação universal e
medidas de proteção à saúde. A atuação intencional de descoordenação do (des)governo
federal só agravará ainda mais um quadro sanitário e econômico muito complicado.
A superação da crise econômica deveria ser orientada por um projeto nacional de
desenvolvimento, que o país não tem; que mobilizasse a recuperação da capacidade
ampliada de investimento público em infraestrutura econômica e social, com instrumentos
adequados e inovadores para aportes de longo prazo e articulados com investimento
privado. Os desafios sociais e ambientais deveriam ser vetores mobilizadores de uma
resposta econômica condizente com a superação das desigualdades e da pobreza,
comprometida com as metas de reversão da emergência ambiental.
De imediato, as medidas econômicas deveriam estar voltadas para a geração de
empregos para todos, animando a retomada das atividades produtivas com segurança
sanitária, integrando todos os governos subnacionais para a criação de empregos de
interesse público e social, recuperando o sistema público de emprego, trabalho e renda para
promover intermediação de mão de obra e formação profissional, oferecer micro crédito
produtivo, entre outros. Manter a proteção de renda com a prorrogação do auxílio
emergencial e ampliação do seguro-desemprego é parte do que é essencial ser feito agora.
Tudo é urgente e deveria ser abordado de maneira estratégica para alçar o país para
uma dinâmica virtuosa de crescimento econômico e desenvolvimento social e ambiental.
Escolhas políticas que um diálogo social comprometido com o interesse geral da nação
deveria produzir em 2021.
*Sociólogo, consultor sindical e assessor do Fórum das Centrais Sindicais.