A cabeça do cineasta Silvio Tendler está em estado de criação. De minuto em minuto, ele manda um áudio contagiante em resposta às ações da equipe de trabalho da Secretaria de Cultura e Economia Criativa (Secec). “Vamos lá, tá ficando bonito… Vamos nessa. Vamos fazer um festival inesquecível”. As ideias fluem em velocidade por vias diversas desde que um dos importantes documentaristas da América Latina aceitou o convite do secretário, Bartolomeu Rodrigues, para ser curador do 53º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro (FBCB).
“É uma honra e ao mesmo tempo uma emoção intensa. Tudo junto e misturado num momento de muita dificuldade para a cultura no Brasil por conta da pandemia, mas também de alegria pelos 60 anos de Brasília”, observa o cineasta.
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QUIXOTE BRASILEIRO
Na cabeça multifacetada de artista e produtor, cabem “felicidades” e “tristezas” colhidas com o mesmo zelo de quem há cinco décadas cultiva, dia e noite, um pomar de sonhos. De lá brotaram os frutos inquietantes do cinema de Silvio Tendler. Como um Dom Quixote, ele ousou a lutar contra os “moinhos” da ditadura e fez documentários sobre homens políticos, interrompidos e perseguidos em tempos de censura instituída (JK, Jango e Marighella).
“A arte é plural e abarcativa. A arte não tem donos. São pessoas que fazem. Cada artista é uma cabeça. Não tem uma ideologia coletiva. É um conjunto de muitas ideias e, assim, a arte ajuda a mudar o mundo”, ensina Silvio Tendler.
Preocupado com o desestrutura da cultura e da arte no âmbito nacional, Silvio Tendler articula o movimento Estados Gerais da Cultura para a recriação do Ministério da Cultura. “Estamos todos em vigília e luta pela Cinemateca, guardiã de nossa memória, e pelo cinema nacional. Realizar este Festival de Brasília do Cinema Brasileiro neste ano é está no front”, destaca.
Depois de um período intenso de aprendizado sobre cinema entre Chile e França nos anos 1970, num exílio forçado, o jovem Silvio Tendler regressou ao Brasil, em 1976, com essa semente de transformação em explosão. Faz o primeiro longa-metragem, “Os Anos JK – Uma Trajetória Política (1980)”, na chamada fase de “reabertura política lenta e gradual”.
É um sucesso. Oitocentos mil espectadores e prêmios no Festival de Gramado e da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA). Segue com “Jango” (1984 – 1 milhão de espectadores e projeção no Festival de Havana/Cuba). É daí que nascem as referências quixotescas à sua assinatura de diretor como “o cineasta dos vencidos” ou “o cineasta dos sonhos interrompidos”.
NOS BRAÇOS DO PÚBLICO
Abre-se o caminho para um filmografia que ao mesmo tempo encanta e emancipa criticamente o espectador. A plateia do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro entendeu Silvio Tendler como ninguém o fez. Em suas exibições mais marcantes, o cineasta saiu simbolicamente carregado do Cine Brasília com o cobiçado Candango de Júri Popular. “É uma emoção profunda porque se trata do mais político dos políticos festivais do país. É no Festival de Brasília onde tudo acontece”, orgulha-se.
No Festival de Brasília, Silvio Tendler foi consagrado com “Glauber, o Filme – Labirinto do Brasil” (2003 – melhor filme pelo júri popular, prêmio da crítica e dos pesquisadores) e “Encontro com Milton Santos ou O Mundo Global Visto do Lado de Cá” (2006 – júri popular).
EDIÇÃO HISTÓRICA
Hoje, os Candangos ao alcance dos seus olhos são ícones dessa memória de quem não só foi consagrado pela plateia, mas também de quem cuidou de cada detalhe da edição da 29ª edição, em 1996. “Estava como secretário de Cultura e Esportes do DF e fizemos um festival histórico”, pontua.
Naquele ano, “Baile perfumado”, de Paulo Caldas e Lírio Ferreira, ganhou melhor filme numa disputa com longas, que, hoje, são considerados primazes para a filmografia nacional, como “Corisco e Dadá”, de Rosenberg Cariri; “Um Céu de Estrelas”, de Tatá Amaral; “Pequeno Dicionário Amoroso”, de Sandra Werneck; “Como nascem os anjos”, de Murilo Salles; e “O Cego que Gritava Luz”, de Joaquim Batista de Andrade. “Os filmes eram brilhantes. Foi uma disputa emocionante, envolvendo cineastas geniais. Todas as tribos estavam representadas nesta edição. Que orgulho.”
Agora, Silvio Tendler tem a oportunidade de voltar ao Festival de Brasília do Cinema Brasileiro que o consagrou como artista e gestor. Isso explica a cabeça a mil, o trabalho de domingo a domingo, sem hora para acabar, com áudios no WhatsApp minuto a minuto. “Vamos lá, tá ficando bonito, vamos nessa, vamos fazer um festival inesquecível”.
“Estou muito feliz. Não me pediram atestado ideológico, nem ficha política de nada. A consideração que foi dada é a minha capacidade e competência como curador e organizador”.
Então, Silvio Tendler: “Vamos lá, tá ficando bonito, vamos nessa, vamos fazer um festival inesquecível”.
CINCO CURIOSIDADES SOBRE SILVIO TENDLER
TRÊS VEZES NO PÓDIO
Uma das maiores bilheterias de Silvio Tendler é o filme “O Mundo Mágico de Os Trapalhões”, com 1 milhão e 800 mil espectadores. O documentário comemorou os 15 anos do antológico grupo de humoristas. Até hoje, é a maior bilheteria da história do documentário brasileiro, seguida de “Jango” (um milhão de espectadores) e “Os Anos JK” (com 800 mil espectadores). Todos documentários de Silvio Tendler.
CINECLUBISMO NO DNA
Silvio Tendler moldou seu pensamento inicial em cinema no Movimento Cineclubista, na década de 1960, do qual saiu uma geração de ouro de cineastas brasileiros, politizados e dispostos a levar para as telas todas as faces do país.
SENHOR PRODUTIVIDADE
Silvio Tendler produziu e dirigiu cerca de 80 filmes entre curtas, médias e longas-metragens em formato documental, além séries. É uma filmografia coerente e capaz de traduzir um Brasil que anseia liberdade.
“ANOS REBELDES”
A antológica minissérie “Anos Rebeldes” (1992/TVGlobo), uma das inspirações para o movimento “Os Caras-Pintadas” nos anos 1990, tem Silvio Tendler no trio de diretores, ao lado de Dennis Carvalho e Ivan Zettel. Coube a Silvio escolher os fotogramas em preto e branco inseridos na edição. Silvio vibrou com o convite porque aprofundou a pesquisa de colagem de “fotogramas da história do Brasil” já presente em sua filmografia.
FILME DA VIDA
O documentário “Utopia e Barbárie” (2009) levou 19 anos para ser realizado e é uma espécie de balanço dos sonhos de Silvio Tendler. A obra foi filmada em 15 países, viajou o mundo sendo considerada, pela crítica internacional, uma referência sobre as lutas contra as ditaduras militares na América Latina. O jornalista gaúcho Mauro Santayana considerou “Utopia e Barbárie” como uma obra-prima. “Sua visão pessoal do que foram o mundo e o Brasil neste período é antológica, para dizer o mínimo, e representa o clímax de uma carreira.”
Assista à obra de Silvio Tendler no canal Caliban
Assessoria de Comunicação da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do DF
e-mail: comunicacao@cultura.df.gov.br